A descontinuidade epistemológica de 1775-1825: diferenças e semelhanças (nem tudo é o que parece ser)

As configurações do pensamento antes e depois
da descontinuidade epistemológica ocorrida entre 1775 e 1825

as configurações do pensamento antes e depois da descontinuidade epistemológica de 1775-1825

Configurações do pensamento: perfis de diferenças e semelhanças
(nem tudo é o que parece ser)

“Ora, esta investigação arqueológica mostrou duas grandes descontinuidades na epistémê da cultura ocidental:

  •  aquela que inaugura a idade clássica
    (por volta dos meados do século XVII)
  •  e aquela que, no início do século XIX,
    marca o limiar de nossa modemidade.

A ordem, sobre cujo fundamento pensamos, não tem o mesmo modo de ser que a dos clássicos.

Por muito forte que seja a impressão que temos de um movimento quase ininterrupto da ratio européia desde o Renascimento até nossos dias, por mais que pensemos

  •  que a classificação de Lineu, mais ou menos adaptada, pode de modo geral continuar a ter uma espécie de validade,
  •  que a teoria do valor de Condillac se encontra em parte no marginalismo do século XIX,
  •  que Keynes realmente sentiu a afinidade de suas próprias análises com as de Cantillon,
  •  que o propósito da Gramática geral (tal como o encontramos nos autores de Port-Royal ou em Bauzée) não está tão afastado de nossa atual Linguística;

– toda esta quase-continuidade ao nível das idéias e dos temas não passa, certamente, de um efeito de superfície; no nível arqueológico, vê-se que o sistema das positividades mudou de maneira maciça na curva dos séculos XVIII e XIX.

Não que a razão tenha feito progressos; mas o modo de ser das coisas e da ordem que, distribuindo-as, oferece-as ao saber; é que foi profundamente alterado. 

Se a história natural de Toumefort, de Lineu e de Buffon tem relação com alguma coisa que não ela mesma, não é com a biologia, a anatomia comparada de Cuvier ou o evolucionismo de Darwin, mas com a gramática geral de Bauzée, com a análise da moeda e da riqueza tal como a encontramos em Law, em Véron de Fortbonnais ou em Turgot.

Os conhecimentos chegam talvez a se engendrar; as idéias a se transformar e a agir umas sobre as outras (mas como? até o presente os historiadores não no-lo disseram); uma coisa, em todo o caso, é certa: a arqueologia, dirigindo-se ao espaço geral do saber; a suas configurações e ao modo de ser das coisas que aí aparecem, define sistemas de simultaneidade, assim como a série de mutações necessárias e suficientes para circunscrever o limiar de uma positividade nova.”

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Prefácio;
Michel Foucault

Observação: na citação acima do ‘As palavras e as coisas’ dá a impressão de que Foucault está questionando o alinhamento filosófico consciente de Keynes. Note que Richard Cantillon, 1680-1734 teve um período de vida situado bem antes da descontinuidade epistemológica na cultura ocidental situado por Foucault entre 1775-1825.

Richard Cantillon (c. década de 1680 – maio de 1734foi um economista franco-irlandês e autor de Essai sur la Nature du Commerce en Général, livro considerado por William Stanley Jevons como o “berço da economia política”.

William Stanley Jevons (Liverpool, 1 de setembro de 1835 — Bexhill, 13 de agosto de 1882) foi um economista britânico.

Foi um dos fundadores da Economia Neoclássica e formulador da teoria da utilidade marginal, que imprimiu novo rumo ao pensamento econômico mundial, especialmente no que se refere à questão da determinação do valor, solucionando o paradoxo utilidade na determinação dos valores das coisas (por que o pão, tão útil, é barato, e o brilhante, quase inútil, é caro?) que até então confundia os economistas.

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